UA-78357878-1 A Line leu: [Resenha] Toda luz que não podemos ver (ou: as pequenas histórias com as quais a História é feita)

9 de fevereiro de 2016

[Resenha] Toda luz que não podemos ver (ou: as pequenas histórias com as quais a História é feita)





Título: Toda luz que não podemos ver (Original: All the light we cannot see)
Autor: Anthony Doerr
Editora: Intrínseca

(Para uma resenha mais curtinha, passa lá no Instagram ;D )







Tinha um livro com capa azul na bancada da minha tia.  Ela me disse que era ótimo e recomendou que eu lesse. Eu não conhecia sequer a sinopse. E foi assim que acabei lendo e me apaixonando por um livro vencedor do Pulitzer, do qual eu nunca tinha ouvido falar.

(pausa para vocês rirem do quanto eu estava desinformada antes de lerem a minha resenha) 

A Segunda Guerra Mundial exerce um fascínio no mundo literário e cinematográfico que, nos últimos tempos, tem rendido boas histórias. Todo mundo quer escrever sobre a megalomania de Hitler, sobre o holocausto judeu, sobre aqueles que bateram de frente contra o Reich e pagaram o preço. Em Toda Luz que Não Podemos Ver, Anthony Doerr pega essa onda. Mas aponta seus holofotes para protagonistas simples e humanos que estavam apenas tentando seguir seus dias. Marie-Laure, uma menina cega francesa, e Werber, um menino prodígio alemão que acabou na guerra. A história cotidiana das pessoas que viveram a guerra em pontos distantes do poder.

A estrutura narrativa do livro é bem interessante. Um passeio pelo passado com breves flashs do presente. Você sabe exatamente onde os personagens vão chegar, em que situação eles se encontram no presente. A história se desenrola para que possamos descobrir de que maneira isso aconteceu.

Esse retorno ao passado nos permite visitar a infância de Marie-Laure em Paris, no museu em que seu pai trabalhava. Acompanhamos suas primeiras descobertas, seus primeiros anos de cegueira e as engenhosas soluções de seu pai para mantê-la capaz e independente. Pai e filha tem uma relação linda e é delicioso acompanhá-los em seus pequenos rituais. É esse o cenário que aos poucos transforma Marie-Laurie na garota forte, corajosa e segura que vemos enfrentando o presente.

"As mãos de Marie se movem incessantemente, juntando, investigando, testando. (...)Tocar alguma coisa de verdade, ela está aprendendo,(...) significa amá-la" (p.38)

Simultaneamente, assistimos a infância de Werner em um distrito pobre na Alemanha, em que todos os meninos se tornam adultos para trabalhar nas minas de carvão (exatamente o serviço que matou o pai do garoto). Werner e sua irmã Jutta, duas crianças de cabelos prateados e olhos violeta (quase Targaryens) vivem suas pequenas aventuras em um orfanato com mais crianças do que recursos, buscando nos descartes alheios seus tesouros e alegrias. Nesse cenário surge o primeiro rádio de Werner, a partir do qual toda a sua vida se abre para outras possibilidades, o que aos poucos conduz até o soldado inseguro, valioso e muito jovem a que somos apresentados logo no início.

"A Frau Elena diz que agora temos que vir  direto para casa depois da escola. Ela diz que não somos judeus, mas somos pobres o que é tão perigoso quanto ser judeu" (p.73)

A Guerra atinge a ambos de forma esmagadora, mas começa como um rumor distante e inofensivo. Uma mudança de endereço, um serviço especial do museu, algumas visitas ao orfanato, uma escola para alcançar possibilidades além das minas. A Guerra é um sussurro, algumas filas intermináveis e pêssegos cada vez mais difíceis de achar. Heil Hitler é só uma coisa que agora ele precisa repetir junto com as demais lições.

Em suas jornadas, tanto Marie quanto Werner encontram pessoas incríveis que a História não registrou. Muitas pequenas coragens, pequenas atitudes, pequenos passos que mudando a realidade. A Guerra longe dos centros de poder, no cerco à pacata Saint-Malo ou nas corridas em pequenos vilarejos europeus, mostra a face de quem sentiu a guerra sem compreender sua dimensão.

As ausências também são duramente sentidas nas vidas dos dois. Marie-Laure ainda ouve os conselhos do pai que não está. O julgamento de Jutta pesa nas escolhas de Werner mesmo meses depois da última carta recebida pela irmã. Os ausentes-presentes ajudam a dar forma e veracidade para esse romance melancólico e intenso.

Suas histórias se cruzam da melhor maneira que poderiam.

Toda Luz que Não Podemos Ver é uma leitura romanceada, com trechos poéticos e filosóficos, tocante e capaz de emocionar. Em meio aos clichês de romances da Segunda Guerra, uma história com fôlego renovado para explorar as sensações e sentimentos das pessoas comuns da época. Lindo!

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